segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Guardião Desconhecido - Parte IX

A tempestade adensara-se. A visibilidade era quase nula num raio de poucos metros. Contudo, Ricastin conseguia ver perfeitamente a silhueta de Cols Skernh, completamente curvada, parecendo um minúsculo druida vestido de preto. As suas mãos fumegavam e nelas, com grande esforço, segurava a espada dourada que pertencera a Lee Jo. Os seus olhos escuros e vazios reluziam da dor causada pela espada, e da maldade que neles residia. A sua pele completamente despigmentada contrastava com toda a escuridão que o cercava. A sua cara encontrava-se quase disforme com duas fendas no lugar do nariz e uma boca completamente deformada. Mais atrás Saitha, completamente envolto em escuridão tornara-se um espectador. A sua estatura alta e o facto de toda a sua figura ser escuridão, era um espectro, não se podia classificar como uma figura humana ou de algo que se conhecesse, era uma silhueta aproximadamente humana formada de escuridão pura. Apenas a capa e capuz que usava lhe davam a silhueta que possuía, por baixo nada a não ser escuridão se encontrava.
Ricastin até aí um rapaz de estatura normal, que não impunha grande respeito, assumiu uma postura austera e inabalável, segurando firmemente a espada e fitando o inimigo como um predador que se prepara para atacar a presa.
Cols levantou a espada e bateu com ela no lago. A espada desapareceu. Tudo pareceu parar por momentos. A queda do corpo inerte de Cols foi o único movimento num raio de quilómetros. O próprio Ricastin sentiu a sua respiração parar pois tinha noção do que se aproximava. No meio da escuridão os olhos de Saitha brilharam, se é que se pode dizer que tal criatura tem olhos, por baixo do seu capuz e murmurou algo numa língua incompreensível.
Ricastin sabia o que aí vinha. Não estava preparado para tal, nada o está.
Subitamente as águas do lago começaram a formar um intenso remoinho e um enorme rugido foi ouvido. O Leviathan erguera-se contudo ainda aprisionado. Faltava uma chave final, mas mesmo assim é das coisas mais aterradoras que se pode enfrentar, mesmo aprisionado. Um enorme dragão, verde-negro, com uma crista altamente irrigada por vasos sanguíneos, se sangue se pode chamar ao líquido que lhe corre, dando uma tonalidade quase roxa ao verde. Possuía um intermédio entre barbatanas e pernas, talvez tanto tempo aprisionado na água o tivesse feito regredir as patas. A Lenda do Mostro do Lock Ness estava viva só que em versão mais aterradora e poderosa. Os seus dentes estavam dispostos como serras e o seu hálito exalava putrefacção. Não possuía asas se tal acessório lhe puseram, mas se não tivesse aprisionado voaria mais alto e mais rápido que qualquer criatura que conheçam.
Ao aparecer à superfície como que uma explosão varreu toda a zona circundante num raio de centenas de metros, apenas Ricastin e Saitha permaneceram imóveis tudo o resto fora aniquilado.
A criatura encontrava-se agitada, apesar de livre ainda se encontrava presa, faltava a última chave... o núcleo da espada do Guardião. O que significava que Ricastin teria que lutar contra a fúria da criatura presa e a escuridão de Saitha em simultâneo para proteger o núcleo.
Saitha desembainhou uma espada negra quase disforme, uma lâmina negra ondulada irregularmente era tudo o que se conseguia aperceber. Avançou e enunciou umas palavras numa língua incompreensível e Ricastin foi arremessado vários metros por terra. Saitha riu-se e disse:
- Nunca imaginei o Guardião tão fácil de derrotar! Um simples feitiço e és arremessado por terra? Nem quero imaginar o que te aconteceria se o Leviathan te atacasse a sério. Eras vaporizado? AHAHAHAHHA
Ricastin não respondeu. Levantou-se morosamente sem nunca largar a espada. Olhou severamente os seus inimigos e uma brisa soprou por toda a zona devastada. O chão tremeu. Uma chama envolveu a espada de Ricastin e os seus olhos brilharam fortemente. A sua estatura pareceu aumentar e uma armadura de prata lhe cobriu o peito. O símbolo de um leão estava cravado na fronte. Um leão esmagando uma serpente.
Ricastin ergueu a mão esquerda e uma onda de energia se propagou pelo ar arremessando Saitha e abalando o Leviathan.
Saitha voltou a sorrir e disse e tom de ironia:
- É isto o teu melhor? O Grande Guardião só consegue dar isto?
- Veremos...- Respondeu Riscatin. E continuou lentamente a avançar na direcção de Saitha, completamente imune a todos os feitiços que este lhe enviava.
A terra tremia e o céu encontrava-se completamente negro. Enormes rajadas de vento cortavam o ar, e as espadas de ambos encontraram-se. Saitha voltou a ser arremessado, mas desta vez invocou uma massa de energia negra que estava a consumir tudo à sua volta e aproximava-se de Ricastin.
Atingiu-o. A sua armadura partiu-se e Ricastin caiu inerte no chão. Parecia o fim. Tudo estava acabado.
A mente de Ricastin estava um turbilhão, mas de repente acalmou, uma voz o chamara, uma voz familiar. Era a voz de Le Jo.
- Ergue-te e mostra o teu verdadeiro poder...
A voz desvaneceu-se.
Ricastin abriu os olhos e levantou-se. O riso de Saitha desvaneceu-se o próprio Leviathan ficou inerte. Começaram a cair relâmpagos dos céu e um tornado envolver Ricastin. A chama da sua espada intensificou-se. Da espada começou a sair uma esperal de fogo, mas um fogo claro, quase branco. Ofuscante. A espiral cresceu. E de repente... Uma vortex de fogo percorreu e consumiu toda a zona, como um leão galopando pela savana e espezinhando a cobra. Uma energia com um poder de destruição nunca imaginado. Saitha foi vaporizado, qualquer essência que constituísse aquele ser fora extinta por completo. O vortex percorria toda a zona. Um mar de chamas seria uma descrição fraca para tal imagem. Ricastin permanecia imóvel enquanto conjurava o vortex, como se fosse algo que sempre tivesse feito. Os gritos de agonia do leviathan eram abafados pelo vortex.
O vortex parara. Todo o Leviathan se encontrava em carne viva, mas ainda era uma ameaça pois os seus poderes permaneceram, apesar de preso e ferido. Toda a sua camada de escamas regenerou imediatamente.
A batalha havia apenas começado. O final estava longe...

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Guardião Desconhecido - Parte VIII

Chovia torrencialmente. Todos se apressavam a atravessar o átrio da escola para chegarem ás salas o mais secos possível, contudo no meio de tal pressa ninguém reparou num pequeno rapaz caído, no chão, completamente encharcado. Le Jo olhou para ele, e apesar de não o conhecer aproximou-se para o ajudar. O rapaz encontrava-se de rosto coberto e voltado para baixo. Le Jo aproximou-se e perguntou:
- Precisas de ajuda?
A cabeça do pequeno rapaz rodou lentamente na direcção de Le Jo e uns olhos vermelho-sangue apareceram. A face era disforme e a voz gutural.
- Preciso de ti! - disse a criatura, sorrindo maleficamente.
Le Jo soltou um grito de morte e nesse preciso instante passaram por Ricastin muitas das suas antigas memórias de "Guerreiro" e percebeu o que se estava a passar. Ricastin correu em direcção ao local onde sabia que tinha acabado de ocorrer uma tragédia.
Ricastin nunca pensou ser capaz de correr tão rápido, quer dizer, após o enorme flash que tinha acabado de ter sabia que era capaz de muito mais e sem grande esforço, contudo o que o esperava era demasiado aterrador. O corpo de Le Jo encontrava-se inerte, sem cor, gelado de olhos muito abertos, mas vazios, ainda com a sua expressão final de terror na face.
Ricastin afastou as pessoas que rodeavam o corpo e ajoelho-se junto do corpo. No meio de toda a chuva, uma lágrima deslizou pela face dele e caiu no Rosto de Le Jo. De súbto uma enorme luz brilhou no local onde a lágrima havia caído, um sentimento de paz assolou todos os que ali se encontravam. O brilhou aumentou bruscamente, cegando todos menos Ricastin. Uma espada toda de uma prata cujo o brilho não possui descrição possível encontrava-se na frente dos olhos de Ricastin. Do núcleo da espada saiu uma esfera vermelho-sangue, "O Testemunho", murmurou Ricastin olhando com um enorme brilho nos olhos a esfera flutuante.
Tudo agora fazia sentido, a sua memória voltara, a espada, o testemunho e a luz tudo ali se encontrava, mas... a dor voltou quando Ricastin percebeu que corpo ali se encontrava, era um preço demasiado elevado a pagar para poder voltar ao que era. Ele lutou durante eras ao lado dela, protegendo-a sempre e completando o seu fado, mas agora... O escolhido fora derrotado antes de voltar e o guardião não o pode evitar. Agora teria que impedir a hecatombe sozinho. A esperança desvanecia-se...

De súbito, o corpo de Le Jo começa-se a desvanecer em luz, em direcção ao céu. A missão para a qual Ricastin tinha sido criado terminara. Agora nada prendia, sabia que o seu destino seria morrer a tentar salvar a escumalha que o seu Criador tanto adora. Sentia-se revoltado, mas voltou a ser o guerreiro sem medo dos tempos passados. Já não era O Guardião, pois o seu tesouro fora roubado... Era apenas um soldado por abater numa guerra sem vitória possível, mas não vai abandonar o campo de batalha enquanto não o deitarem por terra.
Levantou-se de espada em punho e olhar severo,e subitamente desaparece, aparecendo junto ao lago do seu último sonho.
- Já te esperávamos! - disse uma voz gutural, sorrindo maleficamente, a qual Ricastin identificou de imediato. Era Saitha, a terceira pior coisa que se poderia esperar encontrar um General do Mal.
- Demasiado apressado para uma última batalha, não? - retorquiu Ricastin em tom de ironia.
Saitha riu-se.
-Ambos sabemos de quem será esta batalha a derradeira!
- Tanta tentativa para libertar a criatura e simplesmente aniquilam a chave! Não pensavam que a chave fosse um mero objecto guardado por ela? Pois... ELA era a chave - a cólera assolava Ricastin - E vocês simplesmente destruíram o que vos poderia libertar a tão desejada criatura! - Ricastin tentava colocar-se em posição favorável, desmotivando os adversários, mas a sua mágoa era demasiado notória, era uma perda demasiado pesada.
Saitha riu-se novamente, mas agora de forma mais sonora.
- Não pensaste que nós não tínhamos pensado nisso? não? Se não tens a chave que tal partires a fechadura?
- Mas a única coisa capaz de quebrar a protecção...
- SIM! É a espada do Escolhido! - Disse Saitha sorrindo abundantemente e apontando para o corpo da criatura que matara Le Jo.
O corpo contorcia-se, parecia estar nos seus últimos fôlegos, mas segurava uma espada dourada imensamente reluzente, o brilho dos brilhos, a beleza das belezas, nas mãos.
Ricastin sentiu o seu coração a cair-lhe aos pés.
- Sabes bem que se voltas a usar a espada é ultima coisa que fazes Cols! Por favor dá-me essa espada! - Tentou desesperadamente Ricastin.
- Morrerei eu sei - disse Cols Skernh - mas tu também não sobreviverás nem nenhum querido humano teu! Sei que qualquer de nós que use esta espada não tem retorno, mas terei o gozo de ser eu a dar-lhe o derradeiro uso! - terminou em tremendo sofrimento, pois sabia que não ira aguentar muito mais.
O lago borbulhou. Algo se passava. O momento aproximava-se...

domingo, 1 de novembro de 2009

Um jardim

O céu estava cinzento. As poucas pessoas que restavam encolhiam-se debaixo dos chapéus. Contudo eu levava um objectivo. Não matar, mas talvez alimentar um pouco mais a saudade.
Fui avançando pela "Cidade dos Mortos" em direcção a ti. Encontravas-te rodeada pelos teus. Talvez eu lá estive quase que a mais. São momentos em que me procuro afastar.
Lá estava a tua fotografia. Sorrias. Uma rosa de bronze estava ao teu lado.
Uma escultura de uma rapariga segurando uma pomba direccionada ao céu recebia as gotas de chuva que lhe escorriam pela face como se verdadeiras lágrimas fossem...
Estavas num verdadeiro jardim, onde todos te procuraram dar as melhores flores e deixar o seu nome. E eu? Apenas um botão de rosa sem nome lá deixei, sabendo que irá ter o mesmo destino que tiveste. Um jardim cheio de vida, contudo a tua já por lá nao paira...
A ironia aparece quando te vejo rodeada dos experientes que foram, enquanto tu foste com eles ainda com tanto por descobrir.
O silêncio permaneceu. A chuva caiu. Eu vim embora.
Tu lá continuas...